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terça-feira, 9 de abril de 2019

Pedro Brant

Garotinha

‘Acho que tô sendo egoísta de novo’

Isso não saia de sua cabeça e estava atrapalhando muito mais que ajudando, acreditem. Um escritor que não consegue escrever por culpa, qual a utilidade? Mas pobre escritor, ele está numa situação complexa. A editora deu prazo limite para o seu livro ser finalizado, caso contrário irão desistir do projeto. As crianças estão exatamente nos terríveis dois anos, o único lugar que ele conseguiu paz foi num café a duas quadras de casa. Mas agora o remorso de não ajudar com as crianças o consome e não o deixa escrever em paz.

Os clientes do café podiam observar o nervosismo do escritor pois ficava pressionando sua caneta.

*click* *click* *click*

Ficava encarando o computador, perdido em sua confusão mental, na quantidade de coisas que já tinha criado.

‘Por que sempre é tão difícil terminar uma história?’

Num momento de fraqueza extrema o escritor apenas desistiu. Largou a caneta e deitou-se sobre o notebook. Ficou assim por vários minutos, como que esperando uma magia acontecer. Para a sorte do escritor acho que era um dia mágico afinal.

Uma criança se aproxima e senta-se na mesa. Coloca a mão nas costas de escritor e lhe da alguns tapinhas de conforto. Ele levantou a cabeça incrédulo e encarou uma pequena menininha, com seus cachinhos caindo na altura da orelha, e ficou encarando aqueles olhinhos mas antes que pudesse interpretar o que aquele olhar queria dizer ele descobriu.

-Desculpe senhor. – falou a mãe ao longe quase correndo para pegar a filha de volta – Ela é muda.

Fez um aceno indicando que tudo estava bem e sutilmente o escritor voltou a olhar para a criança que agora estava com um enorme sorriso. Ele se virou para mãe como que contagiado pelo sorriso da pequena pessoinha.

- Se você não estiver com pressa gostaria muito de ter uma conversa com sua filha.

-Mas, -relutou um pouco encarando o homem- ela é muda.

-Sim, mas no momento acho que ela tem mais pra falar que eu em 100 vidas.

A menina ficou com uma expressão de quem estava gostando de toda aquela situação, parecia extremamente curiosa com o que estava acontecendo e com o que iria acontecer. Mas aparentemente dependia de sua mãe permitir.

Ela sentou-se na mesa com eles colocou seu café e devolvendo o sorriso do escritor concordou com um aceno. E se deixou tomar pela mesma curiosidade da garota.

-Sente aqui, a partir de agora você quem fala.

Ela ficou radiante, parecia que era a primeira vez que alguém a convidava para ser o centro das atenções. Ficaram se encarando por alguns momentos. O escritor queria nivelar a situação, então se prometeu que não falaria também, com um gesto com as mãos. Agora eram dois mudos. Sorrindo um para o outro.

A garotinha percebeu a intenção do homem. E começou a gesticular, fazendo mímica se comunicou. O escritor ficou perdido por um tempo, mas assim que pegou o jeito estavam ali ambos fazendo gestos, brincando um com o outro, inventando gestos com significados. Conversando, sobre tudo, sobre nada, apenas se deixando levar.

Ficaram mais de meia hora se divertindo ali. A mãe da garotinha estava apenas observando admirada a alegria de sua filha de estar interagindo com alguém novo. Quando finalmente deram uma pausa, o escritor pegou a garota no colo, e ainda sem dizer uma palavra a entregou para a mãe. O olhar dos três já dizia tudo, carregava a gratidão e alegria de todos os três.

O escritor, agora com a inspiração que precisava, acenou para as duas e sentou-se no computador e foi terminar seu livro, ainda mais ávido para voltar para suas próprias crianças. 

Fonte: medium.com/@christianacromer

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